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domingo, 1 de julho de 2012

mártir de Deus William Tyndale

"if god spare my life, 
ere many years I will cause a boy who drives 
the plough to know more of the scriptures than you do."
     

Devemos agora passar à história do bom mártir de Deus William Tyndale, que foi um instrumento espécie designado pelo Senhor, e como vara de Deus para sacudir as raízes interiores e os fundamentos dos soberbos prelados papais, de maneira que o grande príncipe das trevas, com seus ímpios esbirros, tendo uma especial inquina contra ele, não deixou nada sem remover para poder capturá-lo a traição e com falsidade, e derramar sua vida maliciosamente, como se verá pela história que aqui damos do sucedido.

William Tyndale, um fiel ministro de Cristo, nasceu perto da fronteira com Cales, e foi criado desde menino na universidade de Oxford, onde, por sua longa estância, cresceu tanto no conhecimento das línguas e de outras artes liberais, como especialmente no conhecimento das Escrituras, as que sua mente estava especialmente adicta; e isto a ponto tal que ele, encontrando-se então no Magdalen Hall, lia em privado a certos estudantes e membros Deus Magdalen College algumas partes de sua teologia, instruindo-os no conhecimento e na verdade das Escrituras. Correspondendo-se sua forma de viver e conversação com as mesmas até ponto tal, que todos os que o conheciam o consideravam como um homem das mais virtuosas inclinações e de uma vida irrepreensível.

Assim que foi crescendo mais e mais em seu conhecimento na Universidade de Oxford, e acumulando graus acadêmicos, vendo sua oportunidade, passou dali à Universidade de Cambridge, onde também permaneceu um certo tempo. Tendo agora amadurecido adicionalmente no conhecimento da Palavra de Deus, deixando aquela universidade foi a um tal Mestre Welch, um cavalheiro de Gloucestershire, e ali trabalhou como tutor de seus filhos, estando no favor de seu senhor. Como este cavalheiro mantinha em sua mesa um bom cardápio para o público, ali acudia, muitas vezes abades, prelados, eclesiásticos, com outros doutores e homens de rendas; eles, sentados à mesma mesa que o Mestre Tyndale, costumavam muitas vezes conversar e falar acerca de homens eruditos, como Lutero e Erasmo, e também de diversas controvérsias e questões acerca das Escrituras.

Então o Mestre Tyndale, que era erudito e bom conhecedor dos assuntos de Deus, não poupava esforços por mostrá-lhes de forma simples e lisa seu juízo, e quando eles em algum ponto não concordavam com Tyndale, ele demonstrava claramente no Livro, e expunha de maneira direita diante deles as passagens abertas e manifestas das Escrituras, para confrontar os erros de seus ouvintes e estabelecer o que dizia. Assim continuaram durante um certo tempo, arrazoando e discutindo juntos em várias ocasiões, até que no final cansaram, e começaram a sentir um segredo ressentimento contra ele em seus corações.

Ao ir isto crescendo, os sacerdotes da região, unindo-se, começaram a murmurar e a semear sentimentos em contra de Tyndale, caluniando-o nas tabernas e outros lugares, dizendo que suas palavras eram heresia, e o acusaram secretamente ante o chanceler e ante outros oficiais do bispo.

Aconteceu não muito depois que se concertou uma sessão do chanceler do bispo, e se deu aviso aos sacerdotes para que comparecessem; entre eles foi também chamado o Mestre Tyndale. E não há certeza de se ele tinha temores devido as ameaças deles, ou se alguém o havia avisado de que iriam fazê-lo objeto de suas acusações, mas o certo é que (como ele mesmo declarou) duvidava do resultado de suas acusações; pelo que durante o caminho clamou intensamente a Deus em sua mente, para que lhe desse forças para manter-se firme na verdade de Sua Palavra.

Quando chegou o momento para comparecer diante do chanceler, este o ameaçou gravemente, xingando-o e tratando-o como se fosse um cão, acusando-o de muitas coisas para as que não se podia encontrar testemunha alguma, apesar de que os sacerdotes da região estavam presentes. Assim, o Mestre Tyndale, escapando de suas mãos, partiu para casa, e voltou a seu patrão.

Não longe dali vivia um certo doutor que tinha sido chanceler de um bispo, e que fazia tempo era conhecido familiar do Mestre Tyndale e o favorecia; o Mestre Tyndale foi então visitá-lo, e lhe abriu seu coração acerca de diversas questões da Escritura; porque com ele se atrevia a falar abertamente. E o doutor lhe disse: "Não sabeis que o Pai é o próprio Anticristo de quem fala a Escritura? mas tende cuidado com o que dizeis; porque se chegasse a saber-se que mantendes esta postura, custar-vos-á a vida".

Não muito tempo depois disto aconteceu que o Mestre Tyndale estava em companhia de um certo teólogo, considerado como erudito, e ao conversar e discutir com ele, o induziu nesta questão, até que o dito grande doutor prorrompeu nestas palavras blasfemas: "Melhor estaríamos sem as leis de Deus que sem as do Papa". O Mestre Tyndale, ao ouvir isto, cheio de zelo piedoso e não suportando estas palavras blasfemas, replicou: "Eu desafio o Papa e todas suas leis". E agregou que se Deus lhe conceder vida, antes de muitos anos faria que uma criança que trabalhasse detrás do arado conhecesse mais das Escrituras que ele.

O ressentimento dos sacerdotes foi crescendo mais e mais contra Tyndale, não diminuindo nunca em seus latidos e acosso, acusando-o azedamente de muitas coisas, dizendo que era um herege. Ao ver-se tão incomodado e fustigado, viu-se obrigado a deixar o país, e buscar outro lugar; e acudindo ao Mestre Welch, pediu-lhe que lhe permitisse ir embora de boa vontade, dizendo-lhe estas palavras: "Senhor, percebo que não se me permitirá ficar muito nesta região, e tampouco podereis vós, ainda que quiserdes, proteger-me das mãos dos clérigos, cujo desagrado poderia estender-se a vós se continuardes albergando-me. Isto o sabe Deus; e isto o sentiria eu profundamente".

De modo que o Mestre Tyndale partiu, com o beneplácito de seu patrão, e se dirigiu imediatamente a Londres, onde predicou por algum tempo, como tinha feito no campo.

Lembrando-se de Cutberto Tonstal, então bispo de Londres, e especialmente dos grandes elogios que Erasmo fazia da erudição dele em suas notas, Tyndale pensou para si que se pudesse colocar-se a seu serviço, seria feliz. Acudindo a Sir Henrique Guilford, controlador do rei, e levando consigo uma oração de Isócrates [1], que tinha traduzido do grego para o inglês, lhe pediu que falasse por ele ao mencionado bispo, o que este assim fez; também lhe pediu que escrevesse uma carta ao bispo e que fosse com ele a vê-lo. Assim fizeram, e entregaram a carta a um servo do bispo, chamado William Hebilthwait, um velho conhecido. Mas Deus, que dispõe secretamente o curso das coisas, viu que não era o melhor para o propósito de Tyndale, nem para proveito de Sua Igreja, e portanto lhe dei que achasse pouco favor aos olhos do bispo, o qual respondeu assim: Que a sua casa estava lotada, que tinha mais do que podia usar, e que lhe aconselhava buscar por outras partes de Londres onde, disse, não careceria de ocupação.

Rejeitado pelo bispo, acudiu a Humphrey Mummuth, magistrado de Londres, e lhe pediu ajuda; este lhe deu hospitalidade em sua casa, onde viveu Tyndale (como disse Mummuth) como um bom sacerdote, estudando dia e noite. Só comia carne assada por seu beneplácito, e tão somente bebia uma pequena cerveja. Nunca foi visto vestido de linho na casa em todo o tempo em que morou nela.

E assim permaneceu Mestre Tyndale em Londres quase por um ano, observando o curso do mundo, e especialmente a conduta dos predicadores, como se vangloriavam e estabeleciam sua autoridade; contemplando também a pompa dos prelados, com outras mais coisas, o que desgostava-lhe muitos; até o ponto de que viu que não só não havia espaço na casa do bispo para que ele pudesse traduzir o Novo Testamento, senão também que não havia lugar onde fazê-lo em toda a Inglaterra.

Portanto, e tendo recebido pela providência de Deus alguma ajuda de parte de Humphrey Mummuth e de certos bons homens, saiu do reino, dirigindo-se à Alemanha, onde o bom homem, inflamado por solicitude e zelo por seu país, não recusou trabalhos nem diligencia alguma para levar a seus irmãos e compatriotas ingleses ao mesmo gosto e compreensão da Santa Palavra e verdade de Deus que o Senhor tinha-lhe concedido a ele. Assim, meditando e também conferenciando com John Frith, Tyndale pensou que a melhor forma de alcançar este fim seria que se a Escritura podia ser trasladada à fala do vulgo, e então a gente pobre poderia ler e ver a lisa e simples Palavra de Deus. percebeu que não seria possível estabelecer aos laicos em nenhuma verdade exceto se as Escrituras eras expostas de forma tão direta ante seus olhos em sua língua materna que pudessem captar o sentido do texto; por caso contrário, qualquer verdade que lhe for ensinada seria apagada pelos inimigos da verdade, bem com sofismas ou tradições inventadas, carentes de toda base na Escritura, bem manipulando o texto, expondo-o num sentido absurdo, alheio ao texto, velando o verdadeiro sentido do mesmo.

O Mestre Tyndale considerava que esta era a única causa, ou pelo menos a principal, de todos os males da Igreja: que as Escrituras estavam escondidas dos olhos das pessoas; porque por isso não se podia advertir o abominável das ações e idolatrias praticadas por o farisaico clero; portanto estes dedicavam todos seus esforços e poder para suprimir este conhecimento, de modo que ou bem não fossem lida em absoluto, ou, se lidas, seu reto sentido pudesse ficar escurecido por meio de seus sofismas, e assim pôr laço aos que repreendiam ou menosprezavam suas abominações; torcendo as Escrituras com seus próprios propósitos, em contra do sentido do texto, enganavam assim os laicos sem conhecimentos de maneira que, embora alguém sentisse em seu coração e estiver seguro que tudo quanto diziam era falso, contudo não pudesse responder a seus subtis argumentos.

Por estas e outras semelhantes considerações, este bom homem foi levado por Deus a traduzir as Escrituras a sua língua materna, para o proveito da gente simples de seu país; primeiro fez o Novo Testamento, que foi impresso em 1525. Cutberto Tonstal, bispo de Londres, junto com Sir Tomás More, muito ofendidos, tramaram como destruir esta tradução "falsa e errônea", como eles a chamavam.

Aconteceu que um tal Agostinho Packington, que era vendedor de sedas, estava então em Amberes, onde se encontrava o bispo. Este homem favorecia a Tyndale, porém simulou o contrário ante o bispo, desejoso de executar seu propósito, e disse que de boa vontade compraria os Novos Testamentos. Ao ouvir isto, Packington disse: "Senhor! Eu posso fazer mais nisto que a maioria dos mercadores que há aqui, se voz compraz; pois conheço os holandeses e estrangeiros que os compraram de Tyndale; se aprouver a vossa senhoria, terei a bem desembolsar o dinheiro para pagá-los, e isto assegurará ter todos os livros impressos e não vendidos". O bispo, que pensava ter pegado a Deus, disse: "De pressa, bom mestre Packington; consegue-os para mim, e te pagarei o que custem; porque é minha intenção queimá-los e destruí-los em Paul's Cross". Este Agostinho Packington foi a William Tyndale e explicou-lhe o sucedido e assim, pelo arranjo realizado entre eles, o bispo de Londres obteve os livros, Packington seu agradecimento, e Tyndale o dinheiro.

Depois disto, Tyndale corrigiu de novo aquele mesmo Novo Testamento, e voltou imprimi-lo, com o qual chegaram a ser muito mais numerosos na Inglaterra. Quando o bispo se apercebeu disso, mandou buscar a Packington, e lhe disse: "O que aconteceu que há tantos Novos Testamentos espalhados? Me prometeste que ias comprá-los a todos". Então Packington repus: "Sim, eu comprei todos os que havia, porém vejo que desde então imprimiram mais. Vejo que isto nunca vai melhorar em tanto tenham letras e imprensas; portanto, o melhor será comprar as imprensas, e assim ficareis seguro". O bispo sorriu ante esta resposta, e assim ficou a coisa.

Pouco tempo depois aconteceu que Jorge Constantino foi apreendido como suspeito de certas heresias por Sir Tomás More, que era então chanceler da Inglaterra. E More lhe perguntou: "Constantino! Gostaria fosses claro numa coisa que te perguntarei; e te prometo que te mostrarei favor em todas as outras coisas de que te acusam. Além do mar estão Tyndale, Joye, e muitos de vós outros. Sei que não podem viver sem ajuda. Há os que os socorrem com dinheiro, e tu, estando com eles, tiveste tua parte, e, portanto, sabes de onde provém. Rogo-te me digas: de onde vem tudo isto?" "Meu senhor", respondeu Constantino, "direi-vos a verdade; é o bispo de Londres quem nos tem ajudado, porquanto nos deu muito dinheiro por Novos Testamentos para queimá-los; e isto é o que foi, e continua sendo, nosso único auxílio e provisão". "A fé", disse More, "que eu penso como vós; porque disto adverti o bispo antes que empreendesse esta ação".

Depois disto, Tyndale começou a tradução do Antigo Testamento, acabando os cinco livros de Moisés, com vários dos mais eruditos e piedosos prólogos mais dignos de leitura uma e outra vez por parte de todos os bons cristãos. Enviados estes livros por toda a Inglaterra, não se pode dizer quão grande foi a luz que se abriu aos olhos de toda a nação inglesa, que antes estavam fechados nas trevas.

A primeira vez que se foi do reino, se dirigiu à Alemanha, onde conferenciou com Lutero e outros eruditos; depois de ter passado lá um certo tempo, se dirigiu aos Países Baixos, e viveu principalmente na cidade de Amberes.

Os piedosos livros de Tyndale, e especialmente o Novo Testamento que traduziu, após começar a chegar a mãos do povo e a espalhar-se, deram um grande e singular proveito aos piedosos; porém os ímpios (invejando e desprezando que o povo pudesse ser mais sábio que eles, e temendo que os resplandecentes reflexos da verdade descobrissem suas obras de maldade) começaram a agitar-se com não pouco barulho.

Depois que Tyndale houve traduzido o Deuteronômio, querendo-o imprimir em Hamburgo, zarpou para lá; mas naufragou diante da costa da Holanda, perdendo todos seus livros, escritos, cópias, dinheiro e tempo, e viu-se obrigado a começar tudo de novo, chegou a Hamburgo em outra nave onde, citado, o esperava Coverdale, quem o ajudou na tradução de todos os cinco livros de Moisés, desde a Páscoa até dezembro, na casa de uma piedosa viúva, a senhora Marguerite Van Emmerson, o ano 1529 de nosso Senhor; naquele tempo se deu uma grande epidemia de umas febres sudoríferas naquela cidade. Assim, acabada sua atividade em Hamburgo, voltou para Amberes.

Quando na vontade de Deus foi publicado o Novo Testamento na língua comum, Tyndale, seu tradutor, agregou ao final do mesmo uma epístola, na qual pedia que os eruditos corrigissem sua tradução, se encontrassem algum erro. Portanto, caso ter havido qualquer falta que merecesse ser corrigida, teria sido uma missão de cortesia e bondade que homens conhecedores e com critério mostrassem nisso sua erudição, corrigindo os erros que existissem. Porém o clero, que não queria que o livro prosperasse, clamou contra ele que havia mil heresias entre suas capas, e que não devia ser corrigido senão totalmente suprimido. Alguns diziam que não era possível traduzir as Escrituras ao inglês; outros, que não era legítimo que os laicos as tivessem; alguns que faria hereges de todos eles. E com o fim de induzir os governantes temporais a executarem os desígnios deles, disseram que conduziria o povo a rebelar-se contra o rei.

Tudo isto o narra o próprio Tyndale, em seu prólogo antes do primeiro livro de Moisés, mostrando além disso com quanto cuidado foi examinada sua tradução, e comparando-a com suas próprias imaginações, e supõe que com muito menos trabalho teriam podido traduzir uma grande parte de Bíblia, mostrando além disso que repassaram e examinaram cada til e cada jota de tal modo, e com tal cuidado, que não havia uma só que, se carecer do ponto, não o observassem, e o mostrassem às pessoas ignorantes como prova de heresia.

Tantas e tão descaradas foram as tretas do clero inglês (que deveriam ter sido os condutores à luz para o povo), para impedir o conhecimento das Escrituras às pessoas, que nem queriam traduzir eles mesmos, nem permitir que outros traduzissem; isto com o fim (como diz Tyndale) de que, mantendo ainda o mundo nas trevas, pudessem dominar as consciências das pessoas por meio de vãs superstições e de falsas doutrinas, para satisfazer suas ambições e exaltar sua própria honra por acima do rei e do imperador.

Os bispos e prelados jamais descansaram até lograrem que o rei consentisse em seus desejos; razão pela qual se redigiu uma proclamação a toda pressa, e estabelecida sob a autoridade pública, no sentido de que a tradução do Novo Testamento de Tyndale ficava proibida. Isto teve lugar por volta de 1537. e não contentes com isso, fizeram mais ainda, tratando capturar Tyndale em suas redes para tirá-lhe a vida; agora falta relatar como lograram executar seus planos.

Nos registros de Londres aparece de forma manifesta como os bispos e Sir Tomás More, sabendo o que tinha acontecido em Amberes, decidiram investigar e examinar todas as coisas acerca de Tyndale, onde e com quem se alojava, onde ficava a casa, qual era sua estatura, como vestia, de que refúgios dispunha. E quando chegaram a saber todas estas coisas começaram a tramar seus planos.

Estando William Tyndale na cidade de Amberes, se alojou durante mais ou menos um ano na casa de Tomás Pointz, um inglês que mantinha uma casa de mercadores ingleses. Ali foi um inglês que se chamava Henry Philips, sendo seu pai cliente de Poole, um homem galhardo, como se fosse um cavalheiro, com um servo consigo. Mas ninguém sabia a razão de sua chegada ou o propósito com o qual tinha sido enviado.

Tyndale era freqüentemente convidado a comer e jantar com os mercadores; por este médio este Henry Philips se familiarizou com ele, de modo que após um breve espaço de tempo Tyndale depositou grande confiança nele, e o conduziu a seu alojamento, à casa de Tomás Pointz; também o levou consigo uma ou duas vezes para comer ou jantar, e travou tal amizade com ele que por sua petição ficou na mesma casa do mencionado Pointz, a quem além disso mostrou seus livros e outros segredos de seu estudo. Tão pouco desconfiava Tyndale deste traidor.

Porém Pointz, quem não tinha demasiada confiança naquele sujeito, perguntou a Tyndale como havia chegado a conhecê-lo. Tyndale respondeu que era um homem honrado, bem instruído e muito agradável. Pointz, ao ver que o tinha em tanta estima, não disse mais nada, pensado que tinha sido apresentado por algum amigo. O tal Philips, tendo permanecido na cidade três ou quatro dias, pediu a Pointz que viesse com ele fora da cidade para mostrá-lhe umas mercadorias, e andando juntos fora da cidade, conversaram acerca de diversas coisas, incluindo alguns assuntos do rei. Com estas conversações, Pointz nada suspeitou. Porém depois, tendo transcorrido algum tempo, Pointz percebeu que era o que pensava Philips: saber se ele, por amor ao dinheiro, quereria ajudá-lo em seus propósitos, porque tinha percebido já que Philips era rico, e queria que Pointz o soubesse. Porque já tinha pedido antes a Ponitz que o ajudasse em diversas questões, e o que havia pedido tinha sempre desejado fosse da melhor qualidade, porque, em suas palavras, "tenho o suficiente dinheiro".

Philips foi depois de Amberes para a corte de Bruxelas, que está a uma distância dali como de quarenta quilômetros, desde onde se levou consigo para Amberes o procurador geral, que é o fiscal do rei, com certos outros oficiais.

Após três ou quatro dias, Pointz foi à cidade de Borrois, a uma trinta quilômetros de Amberes, onde lhe esperavam uns negócios que iriam ocupá-lo por espaço de um mês ou seis semanas; e durante sua ausência, Henry Philips voltou a Amberes, à casa de Pointz, e entrando nela falou com a esposa deste, perguntando se estava dentro o senhor Tyndale. Depois saiu, e dispus na rua e perto da porta os oficiais que tinha trazido de Bruxelas. Por volta do meio-dia voltou entrar e se dirigiu a Tyndale, pedindo-lhe quarenta xelins, dizendo-lhe: "Perdi minha bolsa esta manhã, ao fazer a travessia entre aqui e Mechlin". Assim que Tyndale lhe deu os quarenta xelins, o que não lhe custava dar se o tinha, porque era simples e inexperiente nas sutilezas malvadas deste mundo. Em seguida Philips lhe disse: Senhor Tyndale, você será meu convidado hoje". "Não", respondeu Tyndale, "hoje saio a comer, e você me acompanhará, e será meu convidado num lugar onde será bem acolhido".

Assim que, quando foi a hora de comer, o senhor Tyndale saiu com Philips, e ao sair da casa de Pointz havia um longo e estreito corredor, pelo que ambos não podiam ir juntos. O senhor Tyndale teria desejado que Philips passasse diante dele, mas este pretendeu mostrar grande cortesia. Assim que o senhor Tyndale, que não tinha muita estatura, passou 1i, e Philips, homem alto e garboso, seguiu-o detrás; este havia disposto oficiais a cada lado da porta, sentados, que podiam ver os que passavam por ela. Philips indicou com o dedo a cabeça de Tyndale, para que os oficiais vissem quem era o que deviam apreender. Os oficiais disseram depois a Pointz, quando já o tiveram encarcerado, como os havia apenado ver sua simplicidade. O levaram ao fiscal do imperador, onde comeu. Depois o procurador geral foi à casa de Pointz, e tomou tudo o que pertencia ao senhor Tyndale, tanto seus livros como os outros pertences; dali, Tyndale foi enviado ao castelo de Vilvorde, a 30 quilômetros de Amberes.

Estando já o senhor Tyndale no cárcere, lhe ofereceram um advogado e um procurador, o qual recusou, dizendo que ele faria sua própria defesa. Predicou de tal modo aos que estavam encarregados de sua custódia, e aos que estavam familiarizados com ele no castelo, que disseram dele que se não era um bom cristão, então não sabiam quem poderia sê-lo.

No final, após muitos arrazoamentos, quando nenhuma razão podia servir, embora não merecesse a morte, foi condenado em virtude do decreto do imperador, dado na assembléia de Augsburgo . levado ao lugar da execução, foi amarrado à estaca, estrangulado pelo verdugo, e depois consumido pelo fogo, na cidade de Vilvorde, em 1536. na estaca, clamou com um fervoroso zelo e grande protesto: "Senhor, abre os olhos do rei da Inglaterra!".

Tal foi o poder de sua doutrina e a sinceridade de sua vida, que durante o tempo de seu encarceramento (que durou um ano e meio) converteu, segundo se diz, a seu guarda, a filha deste, e outros membros de sua família.

A respeito de sua tradução do Novo Testamento, porquanto seus inimigos clamavam tanto contra ela, pretendendo que estava cheia de heresias, escreveu a John Frith da forma seguinte: "Invoco a Deus como testemunha, para o dia em que deva comparecer ante nosso Senhor Jesus, que nunca alterei nem sequer uma sílaba da Palavra de Deus contra minha consciência, nem o faria hoje, ainda me entregassem tudo quanto nesta terra há, seja honra, prazeres ou riquezas".




[1] Isócrates (436-338 a.C.), orador e professor ateniense cujos escritos sobre politica e educação na Grécia do século IV a.C. possuem uma grande importância e um enorme valor histórico (N. da T., Enciclopédia Encarta de Microsoft).

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